É possível ganhar dinheiro como revisor?
Tire suas dúvidas sobre quanto cobrar e quais são os padrões de valores para revisão de textos. Afinal, ganha-se dinheiro com revisão?
— Allan Moraes,18 de junho de 2019
Para tratar dessa questão, há uma resposta breve e uma longa. A resposta breve pode interessar apenas aos curiosos ou como uma explicação aos seus parentes e amigos: sim, é possível ganhar dinheiro como revisor; do contrário, não haveria revisores.
Essa questão pode parecer simples, mas nos interessa mais aqui o que está por detrás da dúvida (a ideia de segurança e estabilidade, de profissionalismo, de realização profissional, etc.) do que a questão em si.
O que essa pergunta esconde muitas vezes é algo como “É possível viver bem e confortavelmente como revisor? É possível ter estabilidade? Vou ganhar o suficiente para poder viajar e realizar meus sonhos?”. Essas dúvidas geralmente afetam revisores iniciantes, estudantes que buscam uma profissão após a faculdade ou pessoas que desejam mudar de área.
Para isso, temos uma resposta mais complexa que tem por objetivo não só responder sim ou não mas também dar dicas e procurar incitar uma reflexão sobre nossa área.
“Iniciantes não devem cobrar menos”
Aqui temos um problema que pode ser visto como a base de todas as confusões na área. Nesses casos, o que se confunde é experiência (no sentido de ser iniciante ou veterano) com habilidade/capacidade.
Se um revisor (qualquer que seja) se depara com algum material para orçar e percebe que o texto tem uma linguagem técnica que ele praticamente não domina, que precisa ser padronizado de acordo com um manual com o qual não tem familiaridade e, além de tudo, que o material vai precisar de alterações profundas, a questão não é “Devo cobrar menos por ser iniciante?”, mas sim “Eu tenho as habilidades necessárias para fazer este trabalho?”. E, repito, esse é um questionamento que deve ser feito por qualquer um, iniciante ou não.
Tanto o revisor inexperiente quanto o revisor experiente que cobram respectivamente um valor mais baixo ou mais alto para fazer um trabalho que vai exigir deles habilidades que eles não têm estarão oferecendo ao cliente um serviço de baixa qualidade. A questão aqui não é se o revisor tem mais ou menos tempo de experiência e de mercado ou quanto será cobrado, mas se ele é a pessoa certa para o trabalho.
Clientes não querem muitas vezes saber se você é iniciante ou veterano; e estão mais interessados em sua capacidade de resolver os problemas deles. Tudo isso, claro, vai se refletir no seu marketing e na sua imagem profissional. Ninguém busca pessoas por suas qualidades negativas (“Eu sou pouco experiente. Não tenho portfólio. Não tenho cursos e capacitação. Não me sinto confiante para pegar este trabalho.”), mas sim por suas qualidades positivas. Cabe a você saber como fazer seu marketing, avaliar se deverá pegar ou não os trabalhos que surgirem (se tem as habilidades necessárias) e quanto deverá receber por eles.
Se não souber como fazer isso, o preço baixo será seu único “marketing”. Desse modo, você pode acabar se tornando o tipo de revisor que cobra R$ 1 por lauda; e este será seu único diferencial — seja você “experiente” ou não. Para evitar se tornar esse tipo de revisor, leia o post “Seu trabalho vale mesmo R$ 1?”.
Valor padrão e valor justo
“Mais” e “menos” são conceitos totalmente relativos. Além disso, existem tantos tipos diferentes de textos, meios e nichos em nossa área que seria utópico dizer que deveria haver uma tabela de valores, um padrão a ser imposto ou qualquer coisa do tipo. O que existe é um valor relativo entre mais e menos para cada nicho: um valor médio.
Lembre-se que “média do mercado” não é o mesmo que “valor padrão”. Por exemplo, se alguém diz que o valor médio (do mercado) para a revisão de uma página na área editorial é de R$ 5, isso pode significar que o valor sempre varia para mais ou para menos. O que influencia essa variação são aspectos como prazo, processo editorial (o texto passou por preparação?), capacitação (o revisor é realmente adequado para o trabalho?), variáveis da própria editora/agência/cliente, etc.
Quando alguém diz que o valor padrão para a revisão de um banner de uma agência é R$ X, o que ela quer dizer na verdade é valor médio. Quando um iniciante lê algo como “valor padrão” ou “padrão do mercado” em grupos e discussões entre revisores, pode acabar acreditando que existe alguma entidade, órgão ou instituição que regulamenta valores e salários; mas nada disso existe.
Outra confusão relativa a valores é causada pelo conceito “valor justo”. Não existe nem poderia existir um valor justo para todos. O valor justo é o valor acertado entre o revisor e o cliente. Dizer algo como “Eu cobro R$ 10 por lauda e acho que esse é um valor justo” no fundo não quer dizer nada. Este é um “valor justo” para essa dada situação, com todos os seus aspectos subjetivos; e isso não pode (nem deve) ser tomado como algo universal.
O revisor iniciante deve estar atento a termos como “padrão” e “justo” porque, por se tratarem de conceitos “universais” (e, por isso, parecerem ter algum “poder de convencimento” a ouvidos não treinados), sugerem a ideia de que existe alguma lei, norma ou regra que aplique um “padrão justo e universal” nas relações de mercado. Novamente, nada disso existe.
Lembre-se: um revisor que, de forma intransigente, impõe um “valor justo” ou um “valor padrão” ao cliente é como um restaurante que anuncia seus pratos pelo valor X porque esse é o “valor justo”, e não porque a comida é boa, o atendimento é ótimo e o restaurante teve boas avaliações de clientes (isto é, por meio de um marketing bom e positivo). Resumindo: pode ser um tiro no pé.
“Os revisores devem impor um valor justo aos clientes”
Neste caso, além da ideia pueril de “valor justo”, o problema é a crença numa espécie de “relação de poder” em que os revisores, apenas porque sabem fazer um dado trabalho, têm todo o poder de decidir quanto devem cobrar.
Tanto quanto valores, as relações de poder e de escolha são relativas: num momento, por exemplo, como revisor freelancer que é procurado por um autor independente, o poder de escolha (quanto cobrar em um orçamento) está geralmente nas mãos do revisor, uma vez que autores independentes podem investir mais ou menos nos seus projetos.
Noutro momento, como quando uma editora busca o trabalho de um revisor, o poder de escolha geralmente está nas mãos da editora, uma vez que ela tem orçamentos fixos, um processo já determinado e valores específicos para cada projeto: assim como ela não pode pagar X reais a mais para o revisor, ela também não pode alterar a capa de um livro e usar uma impressão especial por puro capricho de quem quer que seja.
Ninguém gosta de profissionais intransigentes; e todos gostam de ser bem-atendidos, claro. Lembre-se de que você, como revisor, está oferecendo um serviço e solucionando problemas de outras pessoas. Quando você é o cliente, também busca profissionais que o atendam bem e que saibam negociar – e negociar bem é um dos passos para ganhar bem.
Quanto ganha um revisor?
Outro problema é quando algum iniciante ou profissional não sabe quanto deve cobrar por um trabalho. Ele vai buscar ajuda e pode acabar recebendo respostas ambíguas por dois motivos: 1) apenas ele (o revisor que tem dúvidas) sabe quais são seus gastos, sua capacitação, a natureza do trabalho e quanto o cliente pode/deseja pagar (variáveis); e 2) outros revisores dão respostas se baseando em suas próprias experiências profissionais e não levam em consideração as variáveis citadas.
Uma resposta mais adequada só pode ser dada quando todos conhecem todos os detalhes envolvidos na negociação. E só quem sabe disso é o revisor e seu cliente. Ninguém mais.
O que o revisor iniciante deve fazer nesses casos é analisar as respostas sem se deslumbrar com valores altos ou com histórias de que existem profissionais que ganham rios de dinheiro trabalhando de pantufas em casa. Também deve analisar a própria realidade (capacitação, região, tipo de material, etc.) e quanto deseja ou precisa ganhar por mês, além de quanto terá de trabalhar para alcançar esse resultado.
Não se baseie também em respostas superficiais, uma vez que as pessoas nesses casos podem ter intenções duvidosas, como apenas expor publicamente que cobram muito mais que outros revisores para tentar criar a imagem de que são competentes (e, neste caso, lembre-se novamente de que valor não é igual a habilidade, competência e qualidade).
Para mais dicas sobre como cobrar por um trabalho e como fazer um orçamento, leia o post sobre “Como cobrar por uma revisão de texto”.
Leia também esta pesquisa sobre quanto em média ganham revisores de texto em regime CLT no Brasil segundo o Sine.
Você quer mesmo ser revisor?
Muitos revisores começam a trabalhar na área porque “foi o que apareceu para fazer”; mas isso nunca é uma boa decisão. Você pode estar gastando tempo, energia e dinheiro em algo que não trará realização e satisfação.
Outro problema é que não existe algo como “ser revisor” ou “se tornar revisor” de forma genérica, já que qualquer pessoa pode criar um site ou uma fan page no Facebook e dizer que é revisor porque revisou um livro ou o TCC de um amigo.
O que existe é uma habilidade, uma técnica que é executada por uma dada pessoa. Em suma, o que existe além da questão “Quero mesmo ser revisor?” é “Qual revisor eu quero ser?”.
Como eu disse em outro post aqui no blog (“Revisor também tem estilo”), não existe um “revisor ideal” nem poderia existir. Você deve ter claro em mente qual é seu objetivo: você quer revisar para editoras? Para agências? Quer ficar em casa ou está disposto a ir todo dia a um escritório ou agência? Você quer ter um home office? Deseja sair do antigo emprego? Terminar a faculdade? Quer prestar concurso e ser revisor de uma instituição pública? Você vai revisar poesia, literatura, trabalhos acadêmicos, revistas, games?
Todas essas variáveis vão influenciar suas escolhas e seus objetivos e formar o tipo de revisor que você quer ser. Neste ponto talvez você possa ter compreendido que “ganhar dinheiro como revisor” é apenas uma questão (e talvez uma questão menor) quando a colocamos num cenário maior; e que “ganhar bem” ou “ganhar para sobreviver” ou “o suficiente para realizar sonhos” vai depender de escolhas, objetivos, meios, nichos, tipos de clientes, estratégia e marketing de cada revisor.
Lembre-se também de que forçar os clientes a optarem por este ou por aquele profissional com base apenas no preço do serviço é uma péssima prática tanto para clientes quanto para revisores. Isso significa reduzir e simplificar algo complexo e um trabalho que pode ser muito rico em diversos aspectos a uma questão monetária.
Ganhar dinheiro como revisor é obviamente possível, mas a pergunta que os revisores (especialmente os iniciantes) devem se fazer é “Qual tipo de revisor eu quero ser para ganhar o quanto eu valho?”.
Quanto mais os profissionais da área se preocupam com valores, menos aspectos os clientes terão para basear suas decisões e toda escolha será resumida a um único fator: dinheiro. Para reverter isso, a solução talvez seja nos preocuparmos (e mostrar aos clientes que nos preocupamos) com aspectos como capacitação, qualidade, bom atendimento, marketing, cultura e troca de ideias.